
Votar é fácil, o difícil é contar os votos. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
O TSE divulgou uma longa nota sobre a falha no processamento de dados do Exadata X8 da Oracle na eleição do domingo e a contratação sem licitação da gigante americana que conseguiu a proeza de piorar a sua própria situação.
No texto, divulgado nesta terça-feira, 15, o TSE afirma que contratou “cloud Oracle” da Oracle sem licitação porque só a Oracle vende o “cloud Oracle”, o que atenderia o requisito de inexigibilidade de licitação.
O TSE inclusive cita uma certidão emitida pela Associação Brasileira de Empresas de Software, afirmando que a Oracle tem a exclusividade para vender serviços de cloud Oracle para o governo.
O contrato do TSE com a Oracle foi fechado em março, pelo valor de R$ 26,2 milhões.
A explicação do TSE não toca o tema óbvio, que seria porque comprar processamento de dados na nuvem da Oracle, e não da AWS, Microsoft, IBM ou alguma outra concorrente no mercado.
A decisão é mais intrigante pelo fato de que a escolha poderia ser justificada por algum benchmark técnico do Exadata, do tipo que a Oracle publica em anúncios em jornais no mundo inteiro.
A nota chega a mencionar que a Oracle é um fornecedor de longa data da justiça eleitoral brasileira, fornecendo sistemas de banco de dados para o TSE e os 27 TREs há mais de uma década, incluindo nesse período todas as eleições que utilizaram o sistema de votação eletrônica desde 1996.
O TRE não chega a mencionar questões de compatibilidade com sistemas legados, o que poderia ser outro argumento para comprar mais tecnologia da Oracle no lugar de abrir uma disputa com outros fornecedores.
O Exadata X8, uma plataforma de computação na nuvem rodando localmente no data center do TSE, foi contratado depois da decisão de centralizar o processamento dos votos em Brasília, visando economias de médio e longo prazo.
A explicação de qual foi a falha no equipamento traz mais uma dose de surpresas.
Segundo explica a nota, o TSE tem à disposição um servidor principal “Exadata X8 Full Rack”, com oito nós (núcleos) de processamento, e um “Exadata X8 Half Rack”, com quatro nós, servindo como redundância.
No domingo, no entanto, um dos nós do servidor principal deixou de funcionar, ao mesmo tempo em que ocorreu a lentidão, o que inicialmente levou a equipe de TI do TSE a acreditar que uma coisa teria a ver com a outra.
A justificativa, inclusive, foi apresentada pelo presidente do TSE, ministro Luis Roberto Barroso, ainda no domingo, 15.
Mas não foi bem isso, esclarece agora o TSE na nota, afirmando que a falha em um nó foi solucionada com a redistribuição da carga de processamento nos demais.
O problema é que, no momento em que isso acontecia, a equipe estava focada ao restabelecimento do funcionamento do nó, “atrasando a identificação da causa direta do problema a ser solucionado para maior celeridade na contabilização”.
O verdadeiro problema estava em outro lugar, no que a nota define como “falta de calibragem da inteligência artificial”. É aí que as coisas ficam interessantes.
“A TI identificou que a lentidão foi ocasionada por recurso de inteligência artificial existente em um otimizador do banco de dados Oracle, que garante o processamento veloz”, aponta o texto.
O problema é que essa otimização é realizada pelo banco de dados Oracle utilizando estatísticas, como o tamanho das tabelas e a quantidade de dados nelas existentes.
E os dados não existiam. Como se tratava de um equipamento novo, a totalização dos resultados do primeiro turno das eleições foi realizada em um banco de dados com tabelas totalmente vazias, explica a nota.
A partir das 17h, as tabelas do banco de dados aram a receber mais de um milhão de linhas por minuto.
"O plano de execução gerado pelo computador com o banco vazio mostrou-se inadequado para o processamento com o banco de dados cheio", constata o TSE, acrescentando que o equipamento da Oracle "não deu conta de, simultaneamente e com a rapidez necessária, aprender um novo plano de execução adequado para o processamento do grande volume de dados e realizar a totalização com a celeridade esperada".
O problema poderia ter sido evitado com a realização de testes para calibrar o otimizador, reconhece o TSE.
O problema é que, dos cinco testes planejados pelo TSE, apenas os dois últimos foram feitos com o equipamento Oracle, devido a um atraso de um mês na entrega do Exadata causado pela pandemia do coronavírus.
O texto fecha com uma promessa:
“A falha no plano de execução no primeiro turno não se repetirá no segundo turno, em 29 de novembro, tendo em vista que o otimizador já está calibrado para processar um volume maior de informações de forma célere”.