
Mc Fioti, autor do hit Remix Vacina Butantan. Foto: Matheus Suburbano/Kondzila/Divulgação.
A Fundação Butantan, uma entidade privada de apoio ao Instituto Butantan, órgão público do governo de São Paulo, está dando os os iniciais de um mega projeto com tecnologias SAP, orçado em R$ 91,2 milhões.
O go live da implementação, certamente uma das maiores em curso no país, aconteceu recentemente sem maior alarde por parte do Butantan ou da SAP.
Segundo a reportagem do Baguete averiguou em documentos postados no site da Fundação Butantan, a implementação incluirá uma ampla gama de tecnologias, incluindo o sistema de gestão H/4 Hana e produtos adicionais como o Ariba, para gestão de compras; o Fieldglass, para equipes de campo e o SuccessFactors, para gestão de RH.
O contrato foi fechado diretamente com a SAP e tem cinco anos de validade.
A contratação foi feita sem disputa entre diferentes fornecedores, pelo menos abertamente.
Em setembro do ano ado, de acordo com os documentos, a superintendência da Fundação Butantan divulgou uma nota ratificando a inexigibilidade de seleção de fornecedores para o projeto.
A reportagem do Baguete procurou o Instituto Butantan pedindo uma entrevista visando esclarecer porque a contratação foi feita com inexigibilidade de seleção de fornecedores e por meio da fundação e não do instituto.
O site também adiantou ter interesse em informações sobre a extensão do projeto, como horas de consultoria, treinamento e desenvolvimento adicional de software, o que permitiria ter uma visão mais clara da complexidade do projeto (e por tabela, do valor final da conta).
Depois de algum vai e vem, o Butantan optou por responder por meio de uma nota enviada por meio da sua assessoria de imprensa, disponível na íntegra ao final do texto.
Na sua resposta, o Instituto Butantan esclarece o que já estava esclarecido: que a compra de um “complexo sistema de gestão” foi feita pela Fundação Butantan, uma “entidade privada e sem relação ou subordinação com autoridades públicas”.
“E por ser uma entidade privada, a fundação possui regulamento de compra próprio, que foi seguido e cumprido, não havendo necessidade de processo licitatório”, aponta o texto, agregando ainda que a fundação “preza pela transparência” e disponibiliza em seu site relatórios de atividade e valores de contratos firmados com empresas.
Segundo o Baguete pode apurar, o Butantan está substituindo um sistema de gestão da IFS com pelo menos 10 anos de uso.
A IFS é uma multinacional sueca e lançou ainda em 2007 uma versão do seu produto para a indústria farmacêutica.
A companhia é forte em outros setores como o aeroespacial, que tem em comum com a indústria de farma a necessidade de um controle rígido do ciclo de vida do produto.
O valor de R$ 92 milhões é chamativo (pode estar entre os maiores contratos da SAP no Brasil em 2021), mas é difícil fazer uma avaliação mais concreta sem saber mais detalhes sobre as características do projeto em si.
A SAP sempre fez muito segredo sobre a precificação das suas soluções. As grandes empresas clientes também não costumam abrir essa informação. Clientes no setor público, ou pelo menos de características mistas como o Butantan, que sim divulgam informações um pouco mais abertamente, são relativamente raros.
Alguns casos existem, no entanto. A Corsan, empresa estatal de saneamento do Rio Grande do Sul, anunciou em 2019 um projeto de implementação de SAP no valor de R$ 20,9 milhões.
O escopo era também extenso, mas o contrato era de dois anos, não cinco, e foi fechado com a Meta, uma parceira da SAP, e não diretamente com a multinacional, o que certamente reduz os custos.
Outros fatores que podem elevar o preço do projeto do Butantan são uma maior complexidade da operação, a necessidade de integração com outros sistemas ou uma eventual escassez de profissionais SAP com conhecimento da indústria de farma, tornando os disponíveis mais caros.
Ao longo dos anos, o Baguete falou de relativamente poucos projetos da SAP nesse segmento no Brasil, incluindo nomes como Kley Hertz, Sanofi, Myralis e Eurofarma.
Fazendo a mais uma comparação entre Corsan e Butantan, a multinacional alemã é líder disparada em utilities no Brasil, afirmando ter uma participação de mercado de 80%.
O Instituto Butantan é um centro de pesquisa biológica ligada à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo desde a fundação em 1901.
Com atuação na produção de vacinas, o Instituto se tornou um nome conhecido da população pela produção da CoronaVac, um dos imunizantes mais usados no Brasil contra o coronavírus (a atuação do Instituto foi celebrada pelo MC Fioti, em um vídeo com bilhões de visualizações, literalmente).
Já a Fundação Butantan, criada em 1989 por um grupo de médicos e professores, tem uma atuação mais controversa, como, aliás, não chega a ser incomum com organizações nesse tipo, que combinam características da iniciativa privada, mas ao mesmo tempo tem uma relação próxima com entes públicos.
Em fevereiro, a Folha de São Paulo revelou que três procuradores do Ministério Público de Contas (MPC) de São Paulo publicaram pareceres críticos ao modelo de relação entre o Instituto e a Fundação, apontando que a fundação na verdade estaria istrando o instituto sem a devida transparência.
Procurada pela Folha, a Fundação Butantan disse que os apontamentos dos promotores estavam "absolutamente equivocados e demonstram, no mínimo, desconhecimento do órgão em relação ao modelo de fundações".
Um sistema de gestão serve basicamente para organizar processos de trabalho, financeiros e de produção, introduzindo as chamadas melhores práticas, mas também cristalizando o modus operandi já existente dentro de uma organização, e, em parte, na relação com outras organizações próximas.
No caso da Fundação Butantan, isso pode se provar complexo.
NOTA DO BUTANTAN
O Instituto Butantan esclarece que o produto da empresa SAP, contratado com o objetivo de implementar um complexo sistema de gestão, foi adquirido pela Fundação Butantan, entidade privada e sem relação ou subordinação com autoridades públicas. E por ser uma entidade privada, a Fundação possui regulamento de compra próprio, que foi seguido e cumprido, não havendo necessidade de processo licitatório.
A Fundação preza pela transparência e, tendo isso em vista, disponibiliza em seu site relatórios de atividade e valores de contratos firmados com empresas para os mais diferentes projetos.