
Uma caixinha de surpresas para o Mercado Livre. Foto: divulgação/Mercado Livre.
A MeLi Developers Brasil, uma empresa de desenvolvimento de software ligada à gigante de e-commerce Mercado Livre, acaba de ser condenada na Justiça do Trabalho a trocar de convenção coletiva de trabalho.
Com a mudança, da qual ainda cabe recurso, o Mercado Livre terá que fazer pagamentos extra para os 2,3 mil funcionários do MeLi, num valor que pode chegar a R$ 80 milhões.
A decisão é resultado de uma ação movida pelo sindicato paulista Sindpd, para quem a MeLi Developers tinha o enquadramento sindical errado, negociando sua convenção coletiva até agora com o Sindicato de Empresas de Internet do Estado de São Paulo (Seinesp).
O Seinesp é também com quem o Mercado Livre faz a negociação coletiva dos seus demais empregados.
O acordo com o Seinesp, por exemplo, prevê uma semana de 44 horas de trabalho. Já o Sindpd negociou com o sindicato patronal de tecnologia de São Paulo uma jornada de 40 horas.
Somente pelo cálculo preliminar de horas extras não pagas pelo uso da jornada de 44 horas, um funcionário do MeLi que ganha um salário de R$ 10 mil deve receber cerca de R$ 18,2 mil por ano trabalhado, numa decisão que é retroativa em até cinco anos.
A jornada menor também tem impacto em horas extras, férias, abono de férias, FGTS, 13º salário, multa indenizatória (trabalhadores demitidos sem justa causa) e aviso prévio.
Não se sabe quanto tudo isso vai custar para o Mercado Livre. Para fins de pagamento dos custos do processo, o juiz que deu a sentença estimou a ação em R$ 80 milhões de reais.
“O fato de o Mercado Livre ter criado uma empresa especializada e de ter transferindo parte de seus empregados de TI para ela, evidencia a especialização de suas atividades, tanto que houve a demanda de se constituir um novo estabelecimento, com estrutura física própria, mão de obra especializada e dotação de orçamento individualizado, para a consecução de seus fins que, como foi demonstrado pelas provas dos autos, são diversos daqueles perseguidos pelo grupo, como um todo”, resumiu o juiz da 3ª vara de Osasco, Ricardo Sanchez.
BRIGA SINDICAL
Um aspecto interessante da disputa entre os sindicatos é que o Sindiesp faz parte da mesma família sindical do Sindpd, sendo filiado à Federação Interestadual Trabalhadores em Tecnologia da Informação, que por sua vez é filiada à Central dos Sindicatos Brasileiros.
O presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros é... Antonio Neto, presidente do Sindpd.
Disputas entre sindicatos para saber quem é o representante correto de uma empresa X são frequentes no ambiente sindical brasileiro.
Isso acontece porque os sindicatos buscam definir o seu público potencial nos termos mais amplos possíveis, visando aumentar a base potencial de arrecadação de contribuições.
Assim, apesar de ter no nome “empresas e cursos de informática”, o Sindiesp define na convenção coletiva a sua base de representação com uma lista enorme de atividades, que inclui “sites de leilões e lojas virtuais”, o que é uma definição bem exata da atividade do Mercado Livre.
O Sindpd, por outro lado, alega que a MeLi é uma empresa separada, cujo fim é desenvolvimento de software, o que entra na sua área de atuação, um argumento que foi aceito na Justiça do Trabalho.
O Mercado Livre não é a única empresa envolvida em situações desse tipo.
Muitas empresas “escolhem” por qual sindicato patronal querem ser representadas, visando ter como contraparte um sindicato de profissionais menos poderoso, o que é claramente o caso do Sindiesp em relação ao Sindpd, por exemplo.
Dois exemplos clássicos são os da IBM, que se enquadra sindicalmente como uma varejista, ou a Dell, que negocia com o sindicato dos metalúrgicos de Campinas.