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Recenseadores estarão equipados com mais de 180 mil dispositivos. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil.
Num tempo não tão distante assim, o Brasil fazia o seu censo demográfico só com papel.
Milhões de questionários eram preenchidos a mão e enviados em caminhões para o Rio de Janeiro, onde fica a sede do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Chegando à “cidade maravilhosa”, os dados eram digitados por equipes com mais de mil pessoas e, só depois disso, começavam os processos de crítica do que foi coletado, para depois se fazer as tabulações — um processo que podia levar até quatro anos.
A partir de 2010, o Censo começou a ar por um processo de digitalização, que deve dar um novo salto na versão de 2022, já com dois anos de atraso por conta da pandemia e corte de recursos.
O novo Censo, cujo início está previsto para agosto e o custo total é orçado em R$ 2,29 bilhões, terá pela primeira vez transmissão dos dados instantânea, com a meta de que as primeiras publicações saiam cerca de dois ou três meses após o período de coleta.
As entrevistas serão feitas pelos agentes, chamados de recenseadores, com mais de 180 mil dispositivos móveis de coleta (DMCs), ou simplesmente smartphones Android personalizados, da fabricante paranaense Positivo. A companhia venceu a licitação realizada ainda no final de 2019.
Em 2010, o censo demográfico do Brasil já utilizou DMCs e foi o primeiro do mundo a ser totalmente digital, porém os recenseadores enviavam os dados para o sistema somente ao final do dia, pois dependiam de pontos de apoio com internet.
Desta vez, os smartphones terão conexão através de chips 3G e 4G, ainda sem fornecedor definido.
A licitação está prevista para fevereiro deste ano e o uso do serviço terá tempo determinado: um pouco antes do início da coleta, para compreender o treinamento, e um pouco depois caso alguma operação se estenda.
O SISTEMA
Os celulares serão equipados com um software gerenciador de dispositivos móveis (MDM, na sigla em inglês). No primeiro momento, o programa verifica no IBGE qual é a última versão do sistema utilizada e baixa ela automaticamente.
Ele também deve impedir que os usuários façam instalações indevidas ou os não autorizados.
“Além disso, esse produto possibilita que você tenha um gerenciamento muito bom do dado. A gente garante que, por conta do sigilo, o dado coletado do IBGE não vai ser jamais vazado. Então temos todo um modelo de criptografia forte, de transmissão criptografada e com vários tipos de autenticação exatamente para garantir a integridade do dado”, afirma Arnaldo Lyrio, diretor de informática do IBGE.
Se um recenseador for roubado, as informações daquele aparelho devem ser destruídas assim que o dispositivo se conectar à rede. Além disso, a instituição afirma fazer backups desde dentro do DMC até backups incrementais.
“O IBGE já faz censo desde 1872, então imagina a quantidade de informações que a gente tem. Isso tudo não vaza, porque a gente tem firewalls, um monte de estruturas para garantir exatamente essa questão de segurança”, destaca o diretor.
Lyrio afirma que seria “uma bobagem” afirmar que o IBGE nunca vai ser invadido, mas a instituição tenta se precaver da melhor maneira possível, tendo ligações com o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e com organismos internacionais.
CRÍTICA EM TEMPO REAL
Além disso, os aparelhos adquiridos para o Censo 2022 vão contar com georreferenciamento, registrando as coordenadas geográficas de cada domicílio visitado e criando um banco com dados com todo o caminho percorrido pelo agente de coleta.
“Quando o recenseador sai, ele tem um caminho a percorrer. Esse caminho tem que ser feito e não pode ser outro, pois em outro caminho tem outro colega. Então o supervisor deles tem, em uma tela, o percurso exato que cada um está fazendo”, conta o executivo.
Caso o entrevistador pule duas casas, por exemplo, seu supervisor consegue ver isso e falar com o profissional para saber se o domicílio está vazio. Segundo o IBGE, o objetivo é garantir a cobertura de todo o território nacional sem esquecer de nenhuma residência.
Com a transmissão instantânea dos dados, também será possível atuar junto a erros do agente de coleta quando ele ainda está em campo, como no caso de determinada resposta estar ficando sempre em branco.
“Antigamente, quando era papel, eu só ia ver isso um ano e meio depois de coletado. Agora eu faço a correção na hora em que o problema está acontecendo ou no máximo um dia depois”, compara Lyrio.
Os dispositivos ainda contarão com um chatbot para o entrevistador tirar dúvidas, como calcular a renda média ou pesquisar as definições de logradouro e de domicílio, por exemplo.
Além disso, o cidadão poderá optar por fazer o próprio preenchimento on-line, como já foi possível em 2010. Para isso, será necessário informar a vontade ao agente de coleta, que pegará algumas informações e mandará o link e a chave de o por e-mail e por SMS.
INFRAESTRUTURA
Em relação à infraestrutura, o IBGE utiliza a Microsoft Azure, mas o diretor afirma saber exatamente o que vai e o que não vai colocar na nuvem, seja ela privada ou pública.
“Eu não posso deixar um dado individualizado ir pra nuvem porque eu preciso ter garantias de que ninguém vai olhar ele, nem o próprio fornecedor. Então eu coloco na nuvem só dados, informações e imagens que podem ser divulgadas pelo IBGE”, afirma.
Os dados mais sensíveis vão para o Rio de Janeiro ou para São Paulo, onde estão os dois data centers da instituição. Além disso, existem data centers de menor porte (Ds) em cada unidade da federação.
Para dar e à operação desses 180 mil dispositivos, o IBGE também tem equipes de TI espalhadas por todo o Brasil.
Após o processo, os dispositivos adquiridos vão para o Ministério da Saúde. Eles devem ser utilizados na realização de visitas às residências para fins como pesquisas de endemias, controle sanitário e programas sociais.
MAS POR QUE AGILIZAR O CENSO?
Sobre a necessidade de obter esses dados com agilidade, Lyrio explica que existe todo um sistema de projeção dos números com base em 2010, mas isso precisa ser regulado por coletas reais de tempos em tempos. Quando se fica exclusivamente com estimativas por mais de dez anos, os problemas começam a surgir.
“Não é que o IBGE tenha pressa de fazer o Censo, o ponto é que o Brasil precisa dos números oficiais. O censo demográfico serve como base para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM), então, se eu demoro muito a dar esses números, de repente o município que cresceu muito deveria estar recebendo mais dinheiro”, explica o diretor de informática.
Um exemplo citado é a cidade de Mariana, em Minas Gerais, que sofreu o rompimento de uma barragem de mineração em 2015 e teve uma mudança significativa na população. Neste caso, é preciso saber para quais municípios esses habitantes foram para oferecer os recursos adequados a eles.
“A gestão pública tem que ser embasada em números oficiais e a função do IBGE é retratar o país de uma maneira muito precisa, muito rápida. Para que a gente possa fazer ações públicas que melhorem as condições da sociedade. É urgente”, afirma Lyrio.