
Jacson Barros. Foto: Ministério da Saúde.
Jacson Barros, ex-diretor do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde, o órgão máximo de TI do Ministério da Saúde, assumiu o cargo de gerente de desenvolvimento de negócios estratégicos da AWS em setembro do ano ado.
Barros esteve no comando do Datasus entre fevereiro de 2019 a agosto de 2021. Ele é um executivo experiente no setor de saúde, tendo sido por três décadas diretor de Informática do Hospital de Clínicas em São Paulo.
A troca de posições, um fato corriqueiro no mundo de tecnologia, ganha uma outra dimensão pelo fato de Barros ter atuado no Datasus em um período de grandes investimentos em computação na nuvem no governo federal, inclusive na área de saúde e principalmente envolvendo a AWS.
Quem revelou a contratação de Barros pela AWS foi o Brasil de Fato. Um advogado ouvido pela publicação disse que a contratação não configura uma “ilegalidade expressa”, mas que uma transferência em curto prazo do governo “pode atentar contra os princípios da istração pública”.
O Brasil de Fato procurou o Ministério da Saúde para verificar se o caso chegou a ser analisado no Comitê de Ética ou outro órgão de controle interno. O Ministério não retornou, assim como a AWS (o que não surpreende muito, na verdade).
Dito isso, é preciso pôr as coisas em um contexto. A migração do Datasus para a nuvem da AWS fez parte de uma decisão de alto escalão do governo em apostar em nuvens públicas de grandes fornecedores multinacionais, tomada ainda na istração de Michel Temer.
O primeiro edital do tipo, vencido no final de 2018 pela Embratel oferecendo nuvem da AWS, levou à migração em um total de 26 órgãos públicos, somando R$ 55 milhões (o orçamento anual do Datasus fica na casa dos R$ 400 milhões).
Desde então, o governo Bolsonaro aprofundou a aposta, organizando um novo grande edital para contratação de nuvem pública.
O Serpro, a maior estatal de TI do país, está se posicionando como um broker de nuvens públicas, incluindo a AWS e outros grandes players.
No âmbito estadual, a Procergs, estatal gaúcha de tecnologia, está liderando uma iniciativa semelhante, voltada para os governos estaduais.
Os governos em diferentes níveis parece ter decidido apostar em nuvens públicas e natural que a AWS, sendo o maior player nesse mercado, feche grandes contratos.
Com o governo se tornando um cliente cada vez mais importante, também é natural que a companhia busque contratar profissionais com um background que ajude a ganhar contratos nesse mercado, que é diferente do privado.
Na medida em que aposta mais e mais em fornecedores privados, o governo terá que se tornar um empregador atrativo para profissionais com conhecimento nessa tecnologia, inclusive para posições de alto nível.
Por outro lado, essa rotatividade entre governo e fornecedores, fenômeno conhecido como porta giratória, pode criar conflitos de interesse e dificuldades, inclusive para os próprios fornecedores de tecnologia.
Um dos exemplos mais chamativos é a mega licitação de computação em nuvem do Pentágono nos Estados Unidos, que desatou uma batalha judicial, com a Oracle alegando que o processo foi ilegítimo porque a disputa foi influenciada por dois ex-funcionários da AWS, agora em posições no governo americano.
O projeto ficou atolado por anos a fio, ando da AWS para a Microsoft, até finalmente ser cancelado.
Talvez a solução seja estender para a área de tecnologia o procedimento da chamada quarentena, um período em que é vedado para um funcionário público atuar do outro lado do balcão na iniciativa privada.
É o que já existe na área financeira, onde a porta giratória entre o governo e a iniciativa privada é muito mais frequentada.
Nesta sexta-feira, 25, por exemplo, o Brazil Journal revelou que João Manoel Pinho de Mello, o ex-diretor do Banco Central que esteve à frente do projeto do Pix, vai se juntar à área de análise de empresas do Opportunity em agosto, quando sua quarentena de seis meses acabar.