ATENDIMENTO

Exceder as expectativas do cliente é uma baboseira 384ct

22 de setembro de 2017 - 11:03
Roberto Cohen. Foto: Divulgação.

Roberto Cohen. Foto: Divulgação.

Por Roberto Cohen*
Lugar-comum: “Encante seu cliente”. A maioria das áreas de e (e das empresas) que conheço têm esse lema.

Surpreender, encantar, fazer mais do que o obrigatório, oferecer um e que vá além, blá-blá-blá. Mantra herdado de livros, artigos de internet e palestras motivacionais.

Raramente alguém medita sobre isso.

Afinal, é o que todo mundo fala; então deve ser isso mesmo — a lei do rebanho:

“Se todo mundo vai pra lá, eu vou também”

Bastam um argumento aqui, outro ali e está feita mais uma cabeça que assimila a expressão sem cogitar sua coerência.

Fato incontestável

Então já afirmo: NÃO FAZ. NÃO FAZ SENTIDO ENCANTAR O CLIENTE!

Tal catequese propalada aos quatro ventos diz que se dedicar a tal meta garantirá a fidelização do cliente. É transformar cada experiência do cliente num “algo a mais” (hahaha, parece até discurso de Customer Success e outras metodologias que adoram embutir um “X” na sua sigla), em algo único.

OK, sente-se. Leia este artigo com paciência.

Provavelmente rolará a tela várias vezes. Se estiver sem tempo e quiser apenas o sumário deste texto, anote-o:

Pare de tentar exceder as expectativas e apenas resolva os problemas do seu cliente. Ou limite-se a cumprir o prometido.

Explicarei através de três itens:

1. Uma experiência pessoal.

2.. Um livro esplêndido baseado em pesquisa com milhares de clientes.

3. Um artigo científico.

Se não concordar com os argumentos meus e de terceiros, OK. Inscreva-se no próximo seminário “Encante seu cliente”, “Faça o algo a mais”; invista seus suados tostões que tanto batalhou e saia encantado (mas completamente desnorteado da parte pé-no-chão da gestão).

1. Experiência pessoal

Em todos os meus cursos aos gestores, explico que o objetivo principal não deve ser aumentar a satisfação do cliente, mas sim baixar a sua insatisfação.

Deu um nó na cabeça?

OK, o objetivo é que ele recomende aos outros dizendo “Não tenho do que reclamar do serviço deles; recebo pelo que pago“.

Certo, vamos desdobrar essa nova concepção com a ilustração de alguns eventos.

Minha filha mais velha é “econômica”. Leva o carro para lavar de 15×15 dias. Na primeira vez, paga R$ 30 e sai com o carro limpinho. E feliz da vida.

Na segunda vez, colocam um saquinho de lixo na palanca de mudança. Liga o alerta no cérebro dela e pergunta: “– Tenho que pagar por isso?”. A resposta: “– Não, não; é de graça”. E ela sai feliz da vida.

Na terceira, perguntam se deseja perfume de jasmim ou florais. Já sabem o que acontece em seguida, não? “– Tem que pagar?” A resposta: “– Não, não; é de graça, uma cortesia”. E ela sai feliz da vida.

Na quarta, ela paga os mesmos R$ 30, mas ganha apenas o saquinho de lixo; o perfume não.

Uepaaaaaaaaaaaa.

Travou!

Você presume que ela sai feliz da vida como em todos os eventos anteriores? Não, claro que não.

A empresa foi aumentando a expectativa de satisfação dela em relação aos serviços prestados e subitamente estes decresceram de qualidade (satisfação é sempre algo subjetivo na cabeça do cliente).

Se você conseguir manter a satisfação anterior, OK: comprou um container com um milhão de frasquinhos que durarão 30 anos. Caso contrário… Meu chapa, a chapa vai esquentar.

Idem se você tem um compromisso de resolver seus chamados em 2h, mas a a resolvê-los em 30min. Pensa que poderá voltar às 2h sem uma relação catastrófica com seu cliente?

A satisfação baixará e… A fidelidade vai pelo mesmo caminho.

2. Livro The Effortless Experience

Os autores deste livro (e artigo) — Matthew Dixon, Karen Freeman e Nicholas Toman — pesquisaram 125.000 clientes, mais de 5.000 atendentes em mais de 100 empresas.

E chegaram a algumas conclusões espantosas (ou não).

Encantar o cliente não é uma boa; não garante lealdade à marca. Isso acontece somente em 16% das vezes, mas o custo associado para isso aumenta 10-20%.

O que mais impacta para NÃO acontecer a “lealdade” são os serviços associados. Ou seja, quando precisa pedir ajuda.

É nessa hora que o atendimento se torna responsável por manter ou perder o cliente.

Friso: o centro de atendimento não fideliza o cliente.

Apenas evita — se conseguir — que ele vá embora.

Como escrito antes, a busca frenética por “algo a mais” para o cliente tem a ver com fidelidade (repetir negócios, recomendar, etc.). A ótica dos autores é que o centro de e/atendimento é um elemento da redução de “desfidelização” (não existe essa palavra; mas achei melhor do que “infelidade” que daria uma ideia diferente).

Você, como eu, conhece o mar de horrores que um cliente/usuário atravessa quando precisa resolver um problema junto a um fornecedor:

- Repetir contatos e ligações para ver seu assunto resolvidos.

- Trocar de canais de contato (sair da WEB, e-mail, facebook e apostar na central de atendimento telefônico para definitivamente solucionar seu tópico).

- Aguardar pacientemente (ou não) transferências de ligação ou responsabilidade.

- Repetir as informações novamente.

- Aguentar um serviço robótico (“antes de prosseguirmos gostaria de confirmar seu endereço”).

E assim por diante.

Daí que o atendimento pode conseguir:

a) Mitigar a dita “deslealdade” ou…

b) Reduzir o esforço do cliente para ver seu problema resolvido.

Traduzindo: o e não fideliza. Apenas ameniza o abandono da marca se atender bem, independente se o problema é o produto ou serviço de atendimento.

O grande lance é reduzir o esforço para que o cliente resolva seu problema.

E isso não tem a ver com FCR, TMA (Tempo de Conversão), etc.

Ilustração pessoal:

O segundo ponto de NET na minha casa parou de funcionar. Eu ligo para o atendimento, eles “atualizam o sistema” e ele volta a funcionar.

FCR (First Call Resolution) ótimo.

Nota elevada na Pesquisa de Satisfação.

NPS (Net Promoter Score) ótimo.

Mas em seguida descubro que o canal Globo funciona, mas o GloboNews não!

À la putcha, vou eu ligar novamente para a NET.

Meeeeesmo que tudo se repita de maneira bem-sucedida, o CES (Customer Efortless Score) terá sido uma m*.

Claro, eu precisei ligar várias vezes para ver algo resolvido. As ocorrências foram boas, mas o resultado final — aquela impressão que fica no clente e que ele comenta com os amigos — ruim.

Capisce?

Ou seja, na visão dos autores, a importância destes dois indicadores (FCR ou mesmo Pesquisa de Satisfação e NPS) é baixa.

O que vale é quanto o cliente sofreu (ou não) para ver um problema resolvido.

O livro tem inúmeros gráficos e eu recomendaria firmemente a leitura se você tiver alguma cancha com inglês.

Revolucionará sua cabeça.

Só resta saber se você terá coragem e condições de transformar seu ambiente baseado nele.

3. Artigo científico: Worth Keeping but Not Exceeding Asymmetric Consequences of Breaking Versus Exceeding Promises 

Quando um livro e a opinião de um especialista não bastam, vale-mo-nos de um artigo científico.

Resumo da ópera baseado nas conclusões dos dois pesquisadores, Ayelet Gneezy — professora da Universidade de San Diego — e Nicholas Epley — professor da Universidade de Chicago:

As promessas (leia acordo de serviço, se assim o desejar, by Cohen) podem ser difíceis de manter e quem promete deve gastar seus esforços mantendo-as com sabedoria.

Os resultados de nossas experiências sugerem que é inteligente investir esforços em manter uma promessa porque a quebra pode ser dispendiosa, mas pode ser insensato investir esforços adicionais para superar suas promessas.

Quando empresas, amigos ou colegas de trabalho realizam esforços para manter uma promessa, eles provavelmente serão recompensados. Mas quando gastam esforços extras para superá-las, os mesmos têm grande chance de serem negligenciados.

É o que todo mundo sabe:

Às vezes a gente se martiriza e se sacrifica para dar algo a mais ao cliente. E isso não é percebido. Mas quando a gente erra: cai o mundo, vira motivo de guerra, terrorismo e tudo o mais. Não precisa ser professor de psicologia de universidade reconhecida pra isso.

O importante é que se trata de um trabalho científico: não há espaço para achismos. Eles comprovam estatística e matematicamente tais conclusões.

Daí fica difícil contestar (salvo se você for um guru de Customer Success e tal).

Conclusão

Pare de tentar exceder as expectativas e apenas resolva os problemas do seu cliente. Ou limite-se a cumprir o prometido.

Já escrevi isso, right?

*Roberto Cohen é diretor do 4HD, promove cursos de Service Desk, Help Desk e Atendimento ao Cliente, além de prestar consultoria na área. Esse artigo foi publicado originalmente no Blog da 4HD.

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