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Projeto SAP no Butantan na lupa 6d311v

Tribunal de Contas do Estado de São Paulo investiga super compra de ERP. 4y3zl

29 de novembro de 2022 - 07:00
TCE-SP está olhando o projeto de perto. Foto: Pexels.

TCE-SP está olhando o projeto de perto. Foto: Pexels.

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo está investigando o projeto de implementação de softwares da SAP na Fundação Butantan, um dos maiores negócios fechados pela multinacional alemã no país em 2021.

Segundo revela a Folha de São Paulo, uma análise de técnicos do órgão aponta riscos de superfaturamento na compra, feita sem licitação no valor de R$ 161 milhões.

Além da questão do preço, técnicos do TCE consideraram a contratação de risco elevado pela possibilidade de falhas no processo de execução e a possibilidade do retorno do investimento ficar abaixo do custo contratado. 

O órgão, então, cobrou explicações do Butantan, que ainda não protocolou suas respostas.

Os contratos foram assinados pela Fundação Butatan e a SAP em 2021 e 2022, envolvendo o licenciamento por cinco anos e implementação de um pacote de soluções, incluindo o sistema de gestão S/4 Hana e produtos adicionais como o Ariba, para gestão de compras; o Fieldglass, para equipes de campo e o SuccessFactors, para gestão de RH.

Na avaliação dos técnicos do tribunal, ao qual a Folha teve o, existem alternativas ao pacote de produtos da SAP, o que inviabilizaria uma licitação sem concorrência, o que pode ser feito quando há “inviabilidade de competição”.

O documento ainda afirma que não constam provas de que o produto adquirido não tenha similares no mercado. 

“A falta de pesquisa de preços de mercado e a demasiada especificidade do objeto inviabilizou qualquer ponderação quanto à adequação do montante contratado”, afirma o documento, citado pela Folha. 

Oficialmente, o Tribunal de Contas disse à Folha apenas que  após as justificativas dadas pelo Butantan serem enviadas elas “serão analisadas pelos órgãos técnicos internos que emitirão pareceres que subsidiarão posterior despacho da Conselheira com novas determinações”.

Ouvido pela Folha, o especialista em istração pública da Unesp Álvaro Martim Guedes, disse que a inexigibilidade de licitação pode ser usada quando um parecer técnico aponta que uma única empresa oferece tal produto ou serviço, o que pode acontecer com insumos raros usados numa vacina, por exemplo. 

“Agora para um sistema de gestão, a caracterização de inexigibilidade é muito frágil. Por mais que a SAP seja robusta e tenha renome internacional não significa que não exista outras com a mesma qualidade”, aponta Guedes.

Procurados pela Folha, Butantan e SAP negaram irregularidades e afirmaram que vão prestar todos os esclarecimentos ao órgão de controle. Afirmaram ainda que os valores estão dentro do praticado pelo mercado e destacaram a liderança da SAP no mercado farmacêutico.

“Atualmente, 18 dos 20 maiores produtores mundiais de vacinas estão executando sua produção em soluções SAP, que cobrem o processo de ponta a ponta, desde a produção, ando pela distribuição controlada, istração, até a monitorização pós-vacina”, afirma a Fundação Butatan em nota enviada à Folha.

A fundação disse que o preço do contratado foi verificado está dentro do “valor médio cobrado pela contratada no mercado” e que “existe a certeza” de que “não está sendo praticado, de nenhuma forma, valor abusivo”.

Por sua vez, a SAP disse que o serviço contratado "não pode ser comparado com o anterior" e cobre “o fornecimento de softwares de gestão de compras, de recursos humanos, de mão de obra terceirizada, cadeia de suprimentos, digital, ferramentas analíticas e plataforma em nuvem”.

Segundo o Baguete pôde apurar, o Butantan está substituindo um sistema de gestão da IFS com pelo menos 10 anos de uso. 

A IFS não é uma gigante como a SAP, que teve uma receita de € 27,8 bilhões em 2021, mas também não é nenhuma nanica: os suecos tiveram um faturamento de 800 milhões no mesmo período.

Talvez mais importante que o tamanho em si, a IFS lançou ainda em 2007 uma versão do seu produto para a indústria farmacêutica. 

Os suecos são fortes em outros setores como energia, óleo e gás, manufatura complexa, que tem em comum com a indústria de farma a necessidade de um controle rígido do ciclo de vida do produto.

A empresa é discreta no Brasil, mas já tem uma presença direta no país há algum tempo, depois de comprar a Latin IFS, revenda que até então era responsável por toda a operação latino americana.

COMPRA FOI DISCRETA

A compra do sistema de gestão da SAP pelo Instituto Butantan foi revelada pelo Baguete em dezembro do ano ado.

O go live da implementação, certamente uma das maiores em curso no país, aconteceu recentemente sem maior alarde por parte do Butantan ou da SAP.

A reportagem do Baguete soube do escopo do projeto lendo documentos sucintos postados no site da Fundação Butantan

Uma nota ratificando a inexigibilidade de seleção de fornecedores para o projeto foi publicada já em setembro de 2020.

Na época da matéria, a reportagem do Baguete procurou o Instituto Butantan pedindo uma entrevista visando esclarecer porque a contratação foi feita com inexigibilidade de seleção de fornecedores e por meio da fundação e não do instituto diretamente.

O site também adiantou ter interesse em informações sobre a extensão do projeto, como horas de consultoria, treinamento e desenvolvimento adicional de software, o que permitiria ter uma visão mais clara da complexidade do projeto (e por tabela, do valor final da conta).

Na sua resposta, enviada por meio de nota, o Instituto Butantan esclarece o que já estava esclarecido: que a compra de um “complexo sistema de gestão” foi feita pela Fundação Butantan, uma “entidade privada e sem relação ou subordinação com autoridades públicas”.

É DIFÍCIL SABER PREÇOS

Em que pesem as garantias da SAP e do Butatan, a verdade é que é difícil para um observador externo julgar se o preço do projeto é realista ou não.

A SAP sempre fez muito segredo sobre a precificação das suas soluções. As grandes empresas clientes também não costumam abrir essa informação. Clientes no setor público, ou pelo menos de características mistas como o Butantan, que sim divulgam informações um pouco mais abertamente, são relativamente raros.

Alguns casos existem, no entanto. A Corsan, empresa estatal de saneamento do Rio Grande do Sul, anunciou em 2019 um projeto de implementação de SAP no valor de R$ 20,9 milhões.

O escopo era também extenso, mas o contrato era de dois anos, não cinco, e foi fechado com a Meta, uma parceira da SAP, e não diretamente com a multinacional, o que certamente reduz os custos.

Outros fatores que podem elevar o preço do projeto do Butantan são uma maior complexidade da operação, a necessidade de integração com outros sistemas ou uma eventual escassez de profissionais SAP com conhecimento da indústria de farma, tornando os disponíveis mais caros.

Ao longo dos anos, o Baguete falou de relativamente poucos projetos da SAP nesse segmento no Brasil, incluindo nomes como Kley Hertz, Sanofi, Myralis e Eurofarma. 

QUEM É QUEM

Para entender melhor a situação, é importante entender as diferenças entre o Instituto Butantan e a Fundação Butantan, e porque a segunda compra software de gestão para ser usado pela primeira.

O Instituto Butantan é um centro de pesquisa biológica ligada à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo desde a fundação em 1901.

Com atuação na produção de vacinas, o Instituto se tornou um nome conhecido da população pela produção da CoronaVac, um dos imunizantes mais usados no Brasil contra o coronavírus.

Já a Fundação Butantan, criada em 1989 por um grupo de médicos e professores, tem uma atuação mais controversa, como, aliás, não chega a ser incomum com organizações desse tipo, que combinam características da iniciativa privada, mas ao mesmo tempo têm uma relação próxima com entes públicos.

Em fevereiro de 2021, a Folha de S. Paulo revelou que três procuradores do Ministério Público de Contas (MPC) de São Paulo publicaram pareceres críticos ao modelo de relação entre o Instituto e a Fundação, apontando que a entidade na verdade estaria istrando o instituto sem a devida transparência.

Procurada pela Folha, a Fundação Butantan disse que os apontamentos dos promotores estavam "absolutamente equivocados e demonstram, no mínimo, desconhecimento do órgão em relação ao modelo de fundações".

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