
Entregador do Rappi em Sao Paulo. Foto: Divulgação.
A Rappi foi condenada pela Justiça do Trabalho a contratar diretamente todos os profissionais trabalhando com entregas para a plataforma.
A decisão é da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), que abrange a Grande São Paulo e a Baixada Santista e foi unânime.
Além da contratação, o Rappi foi condenado a pagar uma indenização equivalente a 1% do faturamento de 2022, em razão da lesão coletiva aos direitos dos trabalhadores. Esse valor vai para o Fundo de Amparo do Trabalhador.
Fundada em 2015, na Colômbia, a Rappi está presente em oito países da América Latina além do Brasil. A empresa não abre o faturamento específico no país, mas ele certamente fica na casa das centenas de milhões. Só a Box Delivery, plataforma brasileira adquirida pela Rappi em abril, tinha um faturamento na casa dos R$ 200 milhões.
O grande problema para o Rappi na decisão é que a empresa tem um prazo de trinta dias da publicação do acórdão, independentemente do trânsito em julgado, para deixar de acionar os entregadores sem carteira assinada por ela.
Cada entregador sem carteira assinada acionado pelo aplicativo (que provavelmente não vai carteira de ninguém e recorrer) deve gerar uma multa de R$ 10 mil.
O enquadramento de quem deve ser contratado é também generoso.
Os desembargadores fixaram na decisão que a empresa deverá contratar todo entregador que tiver prestado serviço, pelo lapso mínimo de seis meses, entre os anos de 2017 a maio de 2023, sendo que, dentro desse período, o trabalhador deverá ter feito no mínimo três entregas, em três meses diferentes.
O TRT2 é a segunda instância da Justiça Trabalhista. Em dezembro do ano ado, na primeira instância, a juíza Edivânia Bianchin Panzan, da 55ª Vara do Trabalho de São Paulo, havia julgado improcedente a ação movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Na visão do juiz do trabalho Paulo Sérgio Jakutis, relator da ação, o Rappi se “se utiliza de trabalhadores desemparados da rede de proteção formada pelo direito do trabalho e seguridade social”.
Segundo o texto da decisão, os entregadores não podem ser considerados autônomos, uma vez que recebem orientação sobre como trabalhar, estão sujeitos a medidas disciplinares do Rappi e não são livres para negar entregas.
Procurado pelo site Consultor Jurídico, o Rappi disse que vai recorrer e que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) já tem “diversas decisões contrárias à que apresentou o Tribunal”.
De fato, existem milhares de decisões contrárias ao reconhecimento do vínculo trabalhistas de entregadores e motoristas de aplicativos nas instâncias inferiores, e elas já foram várias vezes referendadas em instâncias superiores.
Por outro lado, de uns tempos para cá parece haver uma virada na Justiça Trabalhista. A sentença do Rappi é a segunda decisão de grande impacto contra as plataformas no último mês.
Ainda em setembro, Justiça do Trabalho de São Paulo condenou o Uber a pagar uma indenização de R$ 1 bilhão por danos morais coletivos, além da obrigação de efetivar os registros CLT dos motoristas com os quais tem contrato.
Assim como o Rappi, o Uber também disse que ia recorrer. É fácil de entender o motivo: contratar todos os entregadores ou motoristas simplesmente inviabiliza a operação das empresas no país.
Em seus posicionamentos sobre as condenações, tanto o Rappi quanto o Uber fazem menção a um grupo de trabalho convocado pelo governo federal para criar uma regulamentação de atividades intermediadas por plataformas (a famosa “uberização” da economia).
A discussão já está encaminhada na direção da criação de um novo status legal para os entregadores e motoristas de aplicativos, que ariam a ter alguns direitos assegurados por lei, sem ser considerados funcionários das plataformas sob o regime CLT.
Isso não quer dizer que as decisões judiciais recentes não tenham um efeito.
Ao criar insegurança jurídica para as plataformas, as sentenças aumentam a necessidade das empresas de fechar logo um acordo para uma nova regulamentação trabalhista, fortalecendo assim por tabela a posição de negociação dos representantes dos motoristas e entregadores.