
Paddy Cosgrave se meteu numa grande confusão. Foto: Divulgação.
Paddy Cosgrave, CEO do Web Summit, desatou um boicote ao evento, um dos maiores no setor de tecnologia, com um tweet sobre as operações militares israelenses na Faixa de Gaza.
“Crimes de guerra são crimes de guerra mesmo quando cometidos por aliados”, disse Cosgrave em um tweet nesta sexta-feira, 13.
Cosgrave não chega a dizer especificamente de que crimes de guerra está falando, mas no dia anterior ao tweet os palestinos acusaram Israel de usar bombas incendiárias com fósforo branco, o que é um crime de guerra. Israel nega a acusação.
O embaixador de Israel em Portugal, Dor Shapira, respondeu no X três dias depois que o país, um dos centros da indústria global de tecnologia, não vai participar da edição 2024, que ocorrerá do dia 13 a 16 de novembro, em Lisboa.
Desde então, pelo menos sete participantes de peso cancelaram suas participações, incluindo representantes do fundos como Sequoia Capital e Andreessen Horowitz e Y Combinator.
No seu perfil do X, Cosgrave (que normalmente tuíta bastante) insistiu no comentário, retuitou mensagens de apoio, reagiu a um comentário mais duro banindo um participante do evento e eventualmente respostou uma nota do evento em si, para depois anunciar um “time off” do Twitter.
A nota do evento é mais longa e adota um tom mais diplomático, lembrando da longa história de parceria com Israel do Web Summit, ao mesmo tempo em que reforça o ponto de vista inicial de Cosgrave.
“Apoio inequivocamente o direito de Israel a existir e de se defender. Apoio inequivocamente uma solução de dois Estados. Como tantas figuras a nível mundial, também acredito que, ao defender-se, Israel deveria aderir ao direito internacional e às Convenções de Genebra – ou seja, não cometer crimes de guerra. Esta crença aplica-se igualmente a qualquer Estado em qualquer conflito. Nenhum país deve violar estas leis, mesmo que tenham sido cometidas atrocidades contra ele”, destacou Cosgrave em nota.
Mais de metade da nota contém menções à visita ao Catar do secretário de estado americano, Antony Blinken, uma outra dimensão do imbróglio geopolítico no qual o Cosgrave colocou o Web Summit.
Um evento muito bem sucedido em Lisboa, o Web Summit apostou nos últimos anos por se tornar uma espécie de franquia.
Neste ano, aconteceu a primeira edição no Rio de Janeiro. Em junho, foi fechado um acordo com o Catar para levar o evento para Doha, capital do emirado, em março de 2024.
Até aí, tudo certo. O problema é que o Catar é um grande financiador e o país de residência da cúpula do Hamas, grupo terrorista palestino cujos ataques sem precedentes dentro de Israel desencadearam a resposta militar do país na faixa de Gaza.
O posicionamento político do novo parceiro do Web Summit foi apontado por diferentes comentaristas na polêmica que se seguiu aos tweets de Cosgrave.
O texto do Web Summit procura amenizar a situação citando os elogios de Blink ao posicionamento do Catar na crise recente e o alinhamento do país com os Estados Unidos.
“Como o governo dos Estados Unidos, o Web Summit acredita em trabalhar com parceiros regionais e locais - incluindo o Catar - para encorajar o diálogo e a comunicação dos quais a paz depende”, aponta a nota.
Independente do mérito último das posições de Cosgrave, ou dos argumentos dos seus detratores, é fácil de ver que o Web Summit não tem absolutamente nada a ganhar ao se envolver em um debate desse tipo.
Criado na Irlanda, o Web Summit se tornou um fenômeno em Lisboa, onde o evento cresceu ao longo de uma década até chegar na casa dos 70 mil visitantes anuais.
Nos últimos anos, talvez vendo que a edição européia chegou no limite, entraram em cena os planos de diversificação. A primeira edição no Rio de Janeiro atraiu 25 mil visitantes.
Acontece que no último ano as condições do ecossistema como um todo mudaram de maneira drástica.
Todo tipo de empresas de tecnologia anunciaram grandes cortes de equipe. Algumas com modelos de negócios mais duvidosos fracassaram de maneira espetacular.
Os fundos, por sua vez, estão sendo mais cautelosos com seus investimentos e já não precisam correr atrás de startups, muito pelo contrário.
Ainda não se sabe o quanto tudo isso vai influenciar no entusiasmo dos jovens nos últimos anos pelo mundo “startupeiro”.
Tendo tudo isso em mente, talvez Paddy Cosgrave fizesse melhor em twittar menos.